terça-feira, 30 de outubro de 2012

As crianças de James I


Em 1898, o escritor realista norte-americano Henry James, naturalizado britânico em 1915, publicava a novela "The Turn of the Screw", que, segundo uma solução adotada por uma tradução espanhola, ficou popularmente conhecida, em língua portuguesa, como "A outra volta do parafuso". 
A obra até hoje divide a crítica especializada que a interpreta ora como uma enigmática história de terror fantasmagórico (qual seria a real natureza do mal apresentado?), ora como uma espécie de trama profundamente psicológica, capaz de confundir e tragar o leitor. 
Em verdade, a trama ganha muito com o que não é dito, com o que não é explicado. O ponto de partida da narrativa é uma espécie de reunião numa velha casa londrina (espécie de hospedagem), onde alguns figurões decidem contar histórias macabras, para matarem o tédio das noites frias. 
Um deles, apresentado Douglas, propõe o relato da história mais aterradora de que se tem notícia e que lhe fora relatada diretamente por um dos envolvidos no caso. 
Douglas pede que os ouvintes tenham paciência, pois em breve chegará a suas mãos uma espécie de diário que descreve todo o evento. 
Neste ponto, também os leitores aguardam a chegada do manuscrito que não tarda e alguns dias após seu anúncio, passa a ser lido por Douglas. Trata-se das anotações de uma anônima senhorita, de origem humilde e extremamente religiosa, que é contratada por um excêntrico, belo e endinheirado jovem para que cuide de seus sobrinhos órfãos que vivem numa de suas grandes propriedades no interior.
Ao contratá-la como governanta, o sujeito estipula uma única condição inviolável: não deve, em hipótese alguma, contatá-lo para informá-lo a respeito da vida das crianças. Deve agir como se ele não existisse. 
Encantada com o cavalheiro, a pobre donzela decide aceitar o emprego e acatar a condição estipulada. Na mansão, conhece as duas crianças Flora e Miles e, conforme convive com ambas, percebe que os pobres estão sendo amaldiçoados/perseguidos por fantasmas de antigos funcionários da família. 
Que o leitor não espere um final "cor-de-rosa", destes abundantes em narrativas de vampiros que brilham sob o Sol. Curioso é que, contrariando a ojeriza típica do bom escritor em relação à construção de personagens infantis, Henry James utiliza-se exatamente deste procedimento para aumentar nosso terror: todos se compadecem da vulnerabilidade infantil. Vale! 

MIRANDA, Rafael Puertas de. As crianças de James IJornal Mogi News, Mogi das Cruzes, 14 de Outubro de 2012. Caderno Variedades, p. 07.

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