quarta-feira, 6 de junho de 2012

Dia "D"

Certa vez, querido leitor, quando ainda se arriscava nos terrenos da literatura, o senhor Diogo Mainardi, em sua providencialmente extinta coluna semanal publicada na revista Veja, declarara estar “enjoado” da obra do grande poeta brasileiro Carlos Drummond de Andrade.
O enojado articulista, movido por questões de natureza política e por mesquinhos interesses polemistas (diga-se de passagem, fatores que sempre lhe garantiram espaço naquela mídia e não simplesmente a inteligência), classificou o escritor mineiro como “piegas”, destacando o que para ele se apresentava como “sentimentalismo ginasiano”, “lirismo kitsch” e “uma ironia amável, cúmplice, que se esforça para confortar e apaziguar”.
O crítico improvisado, ainda, condenou o poeta da “pedra no meio do caminho” pelo seu breve flerte com o ideário de esquerda, sugerindo este evento biográfico como um mero “modismo” e o denuncia como portador de uma “falsa modéstia” meticulosamente planejada (não sabe do horror do poeta ao tomar conhecimento do expurgo stalinista).
Enquanto ruminava os próprios dentes, vociferando tolices contra a obra (poesia e prosa) do ilustre itabirano, o mequetrefe Mainardi, para justificar seu bom gosto literário e arquitetar seus corriqueiros, desgastados e previsíveis contragolpes lógicos, elegia o poeta recifense João Cabral de Melo Neto como uma espécie de “antídoto” certo para atenuar os efeitos colaterais da poesia de Drummond.
Covarde Mainardi! Fosse Drummond vivo, sapatearia na cabeça do sujeito. Até João Cabral, dono de um estilo poético marcadamente influenciado, no início, pelo fazer poético do criticado, talvez se rebelasse, se na época ainda estivesse entre nós.
A verdadeira força da obra drummondiana é o seu caráter multifacetado, uma verdadeira “biografia poética/intelectual” de uma das maiores sensibilidades do século XX, e que, ainda hoje, embala o sério trabalho crítico que privilegia um processo analítico de estudo “parcial” capaz de esmiuçar suas distintas “faces”. Caráter amplo demais para ser valorado por quem erroneamente toma partes pelo todo.
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Esta semana, em virtude da comemoração simbólica do 109º aniversário de Carlos Drummond de Andrade, o Instituto Moreira Salles, entidade responsável pela manutenção do acervo do poeta e grande divulgadora da literatura, lançou o projeto que inaugura no calendário cultural brasileiro o “Dia D - Dia Drummond”. Vale!

MIRANDA, Rafael Puertas de. Dia "D". Jornal Mogi News, Mogi das Cruzes, 06 de Novembro de 2011. Caderno Variedades, p. 03.

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