quarta-feira, 20 de junho de 2012

Vampiros me mordam!

Na antologia de Ensaios “O lugar do Outro” (Toopbooks/UMC - 1999), do saudoso e competente crítico literário taquaritinguense José Paulo Paes (1926-1998), encontramos o delicioso texto “Bruxaria de primeiro mundo”, onde o literato desqualifica a novela global “Olho no Olho”, escrita por Antônio Calmon.
O dramalhão televisivo aproveitava a onda instaurada pelo mequetrefe imortal “Paul Rabbit” (agora, habitante da Suíça) e trazia às telas uma verdadeira miscelânea de clichês e o maniqueísmo típico de qualquer folhetim desta natureza, imprescindíveis para fisgar o grande público. José Paulo esmiúça a trama fraca, ironizando os destrambelhados elementos constituintes deste oportunista pacotão cultural.
Quando o ensaísta menciona a “neomágica cunicular”, cita o historiador Mário Maestri que, em um “interessante artigo”, investiga as raízes sociológicas daquela corrente a fim de elucidar a estratégia comercial de sucesso empregada pelo autor d’O Alquimista.
Segundo Maestri, o Coelho dá cabo de uma “feliz modernização de temas da ideologia mágico tradicional, na sua vertente europeia” (faria mais sentido o Diário do Boitatá, ou não?), inaugurando, entre nós, a “feitiçaria yuppie” com seus personagens bruxos (ou magos...) descolados, modernos, endinheirados, extrovertidos, sempre envolvidos em tramas ambientadas em países do primeiro mundo “para gáudio do imaginário arrivista e fantasioso do brasileiros de classe média”.
Inclusive, querido leitor, poderíamos distender a terminologia sugerida, atentando para as novas dimensões da narrativa de gôndola de supermercado: “feitiçaria yuppie” seria, hoje, o “sobrenatural clean”, com seus lobisomens índios marombados e vampiros dóceis e perfumados.
Como tenho saudades do arquétipo vampiresco asqueroso, antissocial, anti-higiênico, politicamente incorreto e sem escrúpulos, modelo Mojica/Nosferatu. A senhora religiosa Meyer conseguiu “eclipsá-lo”, ou melhor dizendo, higienizá-lo.
A grande ironia é que o discurso da “castidade” embutido de propósito na trama da carola escritora estadunidense (“devo controlar os meus instintos” – fala do vampiro protagonista à beira do pescoço da donzela-peter-parker-versão-girl) não foi assimilado pelos assíduos leitores tupiniquins.
Mas, agora, como diria um amigo, é “gato morto” e, em breve, pousará na prateleira do esquecimento, ao lado do Coelho. Vamos aos outros!

MIRANDA, Rafael Puertas de. Vampiros me mordam!. Jornal Mogi News, Mogi das Cruzes, 08 de Abril de 2012. Caderno Variedades, p. 07.

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