quarta-feira, 6 de junho de 2012

Loa a Júlio

“O ‘poético’ é exatamente a capacidade simbólica de uma forma.”
(Roland Barthes)

Neste sábado, a Secretaria de Cultura de Mogi das Cruzes promoveu a “Noite de Premiação” aos ganhadores dos Prêmios de Cultura e do Mapa Cultural. Na categoria Literatura - Poesia e Conto, vale destacar a homenagem ao finalista do Mapa Cultural Paulista - 2011/2012, o versátil escritor mogiano Julio Seidenthal, que divulga seus textos no “BLOG DO SEIDENTHAL” (blogspot - com mais de seis mil acessos), entre os quais selecionei o poema transcrito integralmente abaixo:

África

Morram, orixás europeus,
miscigenação não é missa,
de quadrados de retos,
que separam seus dialetos,
rinoceronte de gravata e girafa de tailleur?!

África, arranca-te as folhas de baobás,
e as sirva como chá para visitas,
quem bebe ajoelha e não se impõe,
descobrem em êxtase,
que o princípio é feminino e tem a sua cor,
e o verdadeiro miscigeno,
e o arco-íris que não "negra" que é negro,

África,
de ti nós fomos: brancos, amarelos e vermelhos,
e para ti,
nós seremos!
(in: <http://julioseidenthal.blogspot.com.br/>)

Adepto visível da experimentação formal e conhecedor dos mecanismos da boa poesia contemporânea (suas leituras o guiam!), Seidenthal presenteia-nos com um singular texto, exemplo louvável de sua vigorosa expressão poética, alheia a temas pudicos, rimas engessadas, ornamentos inúteis e que, no entanto, não dispensa um ritmo explosivo e marcante (o “estalo”).
Num primeiro momento, destaca-se a revolta sincera de um eu-lírico contra a “organização caótica” de um mundo que funciona de acordo com mecanismos de opressão mascarados por uma hipocrisia velada e ancestral.
Cabe a esta figura lírica, então, a pertinente tarefa de desnudar o poder sedutor e encantatório (a força natural e “feminina”) do espaço/alvo da opressão personificado: a mãe “África”. Para tanto, interpela-a, problematizando e redimensionando seu papel na história da cultura humana; o porvir (“para ti, nós seremos!”).
Enfim, uma verdadeira mostra de força da Literatura do Alto Tietê (inclusive, a praticada no “ambiente virtual”), embalada também pelo relevante trabalho de grupos como o “Entremeio Literário” e o “A.Cura”, bem distantes, pelo visto, da crítica rabugenta e ensimesmada dos arautos da “cultura literária adormecida”. Ou serei otimista demais? Vale!

MIRANDA, Rafael Puertas de. Loa a Júlio. Jornal Mogi News, Mogi das Cruzes, 04 de Dezembro de 2011. Caderno Variedades, p. 03.

Nenhum comentário:

Postar um comentário